O agronegócio em 2024 pode ser responsável por aproximadamente 22% do PIB brasileiro (dados estimados, Cepea/USP), sendo que US$ 1,38 bilhão dessa fatia tem origem nas exportações de frutas (AgroStat), com destaque para os estados de Pernambuco e Bahia, com 22,32% e 17,21% da parcela de frutas exportadas, respectivamente. De acordo com o Plano Nacional de Desenvolvimento da Fruticultura (PNDF), lançado em 2018 no intuito de ampliar a participação dessa cadeia produtiva nas exportações, a meta é chegar em US$ 2 bilhões até o ano de 2028, considerando frutas frescas e derivados.
Para que essa meta seja alcançada, vários elos da cadeia produtiva deverão se unir para que os resultados sejam maximizados. Dentre estes elos, os atores envolvidos no processo de alavancagem da fruticultura deverão dedicar esforços no desenvolvimento de um bom posicionamento estratégico que engloba desde a definição de produto até a criação de fundos de investimento capazes de fornecer recursos para pesquisa e biossegurança. Além disso, produtos de qualidade superior são requisitos obrigatórios de competitividade. Dentre os diversos pontos estratégicos envolvidos no processo, talvez seja a qualidade dos frutos quem definirá onde o Brasil quer chegar.
Os produtores buscam solucionar diversos problemas antes e após a colheita que os impedem de obter frutos de qualidade superior. Muitos esforços têm sido dedicados na tentativa de reduzir o colapso interno em frutos de Manga, aumentar a firmeza em Uva, aumentar a resistência ao transporte em Melão e Melancia, reduzir ou eliminar a rachadura de frutos (fruit splitting) – aqui podemos incluir manga, uva, limão, laranja, maça, melão, melancia – e prolongar o tempo de prateleira de todos eles. Imagine o produtor poder colher o fruto no tempo ideal e distribuir para qualquer lugar do mundo com a tranquilidade de que o produto vai superar todas as adversidades do transporte (temperatura de armazenamento, manuseio, tempo do traslado, etc.) e chegar à mesa do consumidor com a qualidade que ele espera?
É na busca de atender aos mercados mais exigentes que são desenvolvidas novas tecnologias e/ou ferramentas capazes de auxiliar os produtores na obtenção de frutos de qualidade superior, que atendam também às boas características organolépticas. O Brasil possui um serviço de análise nutricional de fruto, chamado de cálcio ligado (Ca-Ligado, marca registrada no Instituto Nacional da Propriedade Industrial-INPI), com metodologia adaptada pela PlantSoil Laboratórios para as condições de frutos produzidos no país, que permite avaliar a qualidade de frutos em relação a possíveis desordens fisiológicas.
A análise indica qual o teor de Cálcio (Ca) no tecido vegetal do fruto que está associado à parede celular. O Ca auxilia na manutenção da estrutura da célula mantendo fortes ligações com substâncias pécticas na lamela média, fortalecendo a parede celular. O incremento de teores totais de Ca nos tecidos da planta nem sempre corresponde à melhor qualidade de fruto. Dentre as diversas formas de Ca presente nas células de qualquer tecido vegetal (Ca solúvel, Ca precipitado e Ca ligado às pectinas na parede celular), a forma associada à parede celular tem sido a que melhor expressa o comportamento do fruto quanto à resistência ao ataque de pragas e doenças, às desordens fisiológicas associadas ao amolecimento, ao choque térmico e ao tempo de prateleira (shelf life).
Embora seja um indicador de qualidade muito importante para avaliação de frutos, é essencial que a informação esteja acompanhada, sobretudo, do teor total de Ca no tecido vegetal. É a partir da relação Ca-Ligado/Ca-Total e dos teores totais dos demais elementos no fruto que é possível traçar o perfil do produto final.
Outros nutrientes ajudam a compor a parede celular e desempenham papel estrutural importante para o tecido vegetal do fruto: Magnésio e Boro. O equilíbrio nutricional na planta tem papel fundamental na estabilidade da parede celular. Outros elementos como o Potássio e Sódio podem atuar na desnaturação dos componentes de parede, reduzindo a qualidade dos frutos.
A PlantSoil Laboratórios já realizou inúmeras análises de Ca-Ligado em amostras de frutos de diferentes culturas e variedades. Em bagas de Uva os teores máximos e mínimos de Ca-Ligado variaram entre 11,6 e 1,3 mg/100 g de fruto fresco, variedades ARRA 15 e Sweet Globe, respectivamente (Figura 1). Em polpas de frutos de Manga, variedade Palmer, já foram determinados teores de até 19,1 mg/ 100g (Figura 2). No melão, os teores de Ca-Ligado têm variado de 1,9 a 4,2 mg/ 100g, variedades Eldor e Pele de Sapo, respectivamente (Figura 3). E teores máximos de 4,2 mg/ 100 g no mesocarpo + endocarpo de frutos de melancia variedade Extasy (Figura 4).
As características genéticas e propriedades de cada cultura e variedade são responsáveis pelas variações nos teores de Ca-Ligado entre elas. Por outro lado, dentro de uma mesma variedade, o manejo nutricional tem desempenhado um papel importante no desenvolvimento dos frutos, podendo resultar em produtos de qualidade duvidosa ou de qualidade superior. Nesse sentido, o manejo nutricional adequado que permita estabelecer os limites ideais de Ca-Ligado no tecido vegetal é depende de insumos de qualidade, época e doses adequadas de aplicação que sejam eficientes na estabilização das substâncias constituintes da parede celular.
A análise de Ca-Ligado é um dos elos da cadeia produtiva da fruticultura para fortalecer e alavancar o setor em busca das metas propostas pelo PNDF. Com investimentos em pesquisa aplicada, seguindo critérios técnicos e científicos, chegaremos no patamar de qualidade necessário para levar o Brasil à liderança mundial em fruticultura de ponta.
Figura 1. Teores de Ca-Ligado em bagas de diferentes variedades de Uva cultivadas no Polo de Fruticultura do Vale do São Francisco.
Figura 2. Teores de Ca-Ligado no mesocarpo (polpa) de frutos de Manga variedade Palmer cultivadas no Polo de Fruticultura do Vale do São Francisco.
Figura 3. Teores de Ca-Ligado no mesocarpo + endocarpo de frutos de diferentes variedades de Melão cultivadas no Polo de Fruticultura do Vale do São Francisco.
Figura 4. Teores de Ca-Ligado no mesocarpo + endocarpo de frutos de Melancia variedade Extasy cultivadas no Polo de Fruticultura do Vale do São Francisco.
Texto: Jailson Cunha, Eng. Agrônomo, Dr. em Solos e Nutrição de Plantas, Sócio fundador e atual Gestor da PlantSoil Laboratórios – jailson.c.c@plantsoil.com.br